7. Riscos de uma deriva tecnológica O factor tecnológico é certamente central na educação para os media. Mas tem sido formulado de tal modo que são muitas as confusões e os riscos de deturpar profundamente os objectivos da formação a promover. No fundamental, os riscos advêm de se pretender polarizar a educação para os media nas tecnologias ou em imputadas exigências decorrentes das tecnologias . Existe hoje um registo de discursos sobre as TIC (tecnologias de informação e comunicação) que balanceia entre o medo e o entusiasmo. Não é, em rigor, um fenómeno novo, mas a velocidade das inovações tecnológicas, conjugada com a performatividade de cada novo “gadget” tem contribuído para a consolidação de um discurso de carga predominantemente positiva no terreno educativo, como se nas tecnologias residisse a possibilidade de, finalmente, a escola se redimir perante a sociedade. Há, nas orientações mais encantadas como nas orientações mais reticentes às tecnologias, uma matriz comum de forte pendor determinista. Ambas assentam na pressuposição de que a difusão e o uso produzem, de forma mais ou menos automática, determinados efeitos, sejam eles positivos ou negativos. E este determinismo está presente, de modo por vezes subliminar, como marca forte dos programas que visam difundir as novas tecnologias de informação e comunicação (NTIC) na escola e, mediante essa via, promover a inovação na educação. No terreno educativo, porém, dir-se-ia que a imagem das NTIC está associada a uma carga predominantemente positiva, como se nestas tecnologias residisse a redenção da escola e da educação escolar perante a sociedade. A interactividade, a auto-aprendizagem, a pesquisa autónoma, a interdisciplinaridade, seriam resultados “naturais” esperáveis das “extraordinário poder” atribuído às novas tecnologias, que grandes grupos multinacionais, sequiosos de aumentar os seus lucros e a sua quota de mercado, não se cansam de agitar e propagandear. Neste quadro, e no sentido de abrir caminho e espaço à Educação para os Media, é fundamental interrogar as concepções e propostas instrumentalistas, modernizantes e tecnocráticas que parecem conquistar hoje os discursos e as orientações de vários sectores-chave da União Europeia e de diversos ministérios da Educação, e procurar enfatizar o lugar dos sujeitos e os grupos que interagem, com a mediação das tecnologias, tendo em conta os seus respectivos contextos de vida. Trata-se de acentuar orientações de pendor pedagógico e cultural, orientadas para o exercício de uma cidadania esclarecida e participada, em que o recurso às tecnologias e a compreensão do seu lugar na vida social habilitem cada vez mais as pessoas e os grupos a uma vida mais autónoma, mais significativa e mais feliz. Há que passar pelas tecnologias, mas para visar mais largo e mais longe: as lógicas e os interesses de que emergem, as tendências que nelas se detectam, as linguagens e os formatos a que recorrem, os usos sociais e formas de apropriação a que dão lugar. O acesso às tecnologias e a mais e melhor informação pode ser condição necessária, mas não é certamente condição suficiente na formação dos cidadãos, nas sociedades dos nossos dias. Como observou Dominique Wolton (1999: 11), “nada há de mais perigoso do que ver na presença de técnicas cada vez mais performativas a condição da aproximação entre os homens”. A Educação para os Media deve ter o seu centro de gravidade não tanto nos media e nas tecnologias, mas, como defendemos atrás, na comunicação e nos processos e competências nela implicados. Como sublinhei noutras ocasiões , constitui um contra-senso despender vastas somas de tempo, dinheiro e energia em grandes programas de fornecimento de tecnologias de comunicação e informação sem uma percepção clara de que tais equipamentos e redes são da ordem dos meios e não da ordem das finalidades. Perante e complexidade crescente dos fenómenos sociais e das opções que somos chamados a assumir; perante a avalanche informativa que os novos e velhos meios de comunicação e informação disponibilizam; perante as mensagens mais díspares que de vários lados procuram seduzir e convencer – torna-se, na verdade, urgente redefinir o conceito de cidadania, redescobrir os campos e as dimensões nele implicados, ensaiar novos modos de aprender a viver, individual e colectivamente, nos novos cenários que se estão a desenhar, com a preocupação de reequacionar o papel e a missão da escola (Pinto, 2003).
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