Sobre o pedido de desculpa do Público A "Nota da Direcção" do Público é, no fundamental, um gesto merecedor de apreço. Depois da peça de anteontem - redigida num registo que é frequente no chamado jornalismo político - e sobretudo da de ontem, seguida de um desmentido claro do próprio Cavaco Silva, não restava mesmo outra atitude, num jornal responsável. Há dois pontos importantes nesta Nota: a afirmação de que "as convicções jornalísticas", mesmo que fundamentadas, devem ser matéria de opinião e não de notícia; e que se deve respeitar os silêncios dos políticos. "Eppure si muove", como diria Galileu. Ao mesmo tempo, a nota deixa uma vaga sensação de que não está tudo dito. Se se reparar bem, a Direcção pede desculpas com base em três motivos: fazer manchete com uma convicção e não com factos comprovados; recorrer a termos ambíguos; e "falar das intenções de Cavaco Silva sem que este tivesse tomado qualquer posição pública". Por alguma razão será que o pedido de desculpas não se dirige também a Cavaco Silva. Fica, de algum modo, implícito que o jornal tinha, de facto, matéria consistente ("vinha a ser trabalhada há várias semanas e resultou do cruzamento de várias fontes"), mas que meteu, por assim dizer, "o pé na argola" quanto ao modo como tratou a informação de que dispunha. O que levanta uma antiga questão e um velho dilema do jornalismo: como conciliar informação de inegável interesse público com o respeito pela confidencialidade das fontes. Neste ponto temos o dever de ir mais longe na discussão e de pedir ao Público que também o faça. A nota restabelece uma certa "ordem jornalística" nos termos em que a temos conhecido: distante dos cidadãos, como alguém já sublinhou. É um jornalismo que não sente necessidade de, em complemento da informação publicada, prestar esclarecimentos sobre os bastidores da notícia, sobre a consistência e os interesses das fontes utilizadas, sobre o alcance e o grau de fiabilidade da matéria difundida. O que constitui uma forma de "irresponsabilidade", no sentido etimológico do conceito. Esta teria sido uma boa ocasião para ir mais longe. Ainda poderá ser.
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