Um testemunho sobre George Gerbner A notícia da morte de George Gerbner, aqui dada ontem por Helena Sousa, fez-me recordar não apenas o contributo científico deste investigador de primeira água, mas também o seu testemunho cívico. Na minha tese de doutoramento, talvez não lhe tenha prestado a devida justiça. Na altura, preocupado que estava com o lugar que a televisão ocupa na vida quotidiana das crianças e com o estudo dos contextos da recepção, via o criador da teoria da enculturação, uma das correntes de investigação mais interessantes do chamado "paradigma dos efeitos", como excessivamente "mediocêntrico". Conheci melhor, já em meados dos nos 90, as suas propostas de teor ambientalista, que chamaram (e chamam) a atenção para a (falta de) qualidade do ambiente simbólico, devido, em especial, ao papel das televisões dominadas pela demogogia mais descabelada. E achei especialmente interessante o seu papel na criação, em 1996, do Cultural Environment Movement, um plataforma de acção cívica de múltiplas e diversificadas ONG. Infelizmente, tanto quanto soube, Gerbner terá sido vítima de oportunismos vários de gente que se fez próxima dele, levando o movimento a debilitar-se e a morrer. Foi com alguma emoção que, na assembleia de Glasgow da IAMCR(International Association of Media and Communication Research), em 1998, um dia me dei conta de que estava sentado ao seu lado, numa das sessões de trabalho. E a ouvi-lo defender, com energia, o efectivo exercício dos direitos e deveres dos cidadãos face aos media. Um dos seus contributos que vejo como centrais reside na hipótese de que não são tanto conteúdos ou programas isolados ou específicos que influenciam as pessoas e a sociedade, mas, antes, a sua repetição, a reiteração de uma lógica, de um padrão de valores e comportamentos - uma mundividência em que as novas gerações são socializadas, tomando-a como referencial. Se quisermos, um meio-ambiente tido como "normal e natural", não sujeito a questionamento. A sua obra continuará a influenciar os estudos dos media, especialmente da TV.
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