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Marcelo era um caso comunicacional único Numa conferência que conduziu sozinho, graças à ausência de Ignacio Ramonet e Ramon Font, José Pacheco Pereira considerou ontem à noite, no Porto, que o afastamento de Marcelo Rebelo de Sousa da TVI não vai ser rapidamente esquecido. Alertando para o facto de ser necessário distinguir entre debate e comentário, Pacheco Pereira rejeitou a invocação do princípio do contraditório como questão válida para criticar o espaço daquele comentador na televisão, até porque o princípio do contraditório é infinito. À margem do tema central da conferência, Democracia e Mediocracia, Pacheco Pereira classificou os comentários de Marcelo Rebelo de Sousa na TVI de caso comunicacional único, visto por mais de um milhão de pessoas. No entanto, reconheceu que o problema daquele espaço no Jornal Nacional era fundamentalmente não haver separação clara entre informação e opinião, uma vez que, salvo poucas excepções, raramente o Professor de Direito era questionado pelo jornalista pivot que, pelo contrário, se limitava a conversar amigavelmente e a ?trocar presentes? com o comentador. "Ler, escrever, contar e ver televisão" Convidado a reflectir sobre o papel dos meios de comunicação social em democracia, Pacheco Pereira confessou à partida que o seu interesse nestas matérias é essencialmente um interesse de cidadania. Por isso, ocupando-se essencialmente da questão mediática no contexto de sociedades democráticas ocidentais, assentes no urbanismo e na industrialização, Pacheco Pereira considerou que o problema dos nossos tempos é que a forma como a sociedade evolui e a revolução tecnológica do último século nos tornou dependentes dos meios de comunicação. «A própria socialização das crianças é também cada vez mais feita pela televisão», afirmou, acrescentando que há disfunções na percepção do tempo e do espaço que decorrem desta dependência. Na opinião do ex-euro-deputado, as pessoas estão habituadas a ritmos mais acelerados do que ao tempo lento da leitura e da escrita. Por conseguinte, para além de ser necessário aprender a ?ler, escrever e contar?, é também imperativo aprender a ?ver televisão?. Alertando para outras distorções do tempo e do espaço, nomeadamente para o facto de os media nos criarem a ilusão de que se conhece toda a realidade, Pacheco Pereira disse ainda que «o Big Brother é uma excelente metáfora das democracias contemporâneas». O ímpeto de escrutinar a democracia e o poder em directo fez com que se tivessem deslocado as decisões para lugares obscuros do poder que não são escrutináveis, à semelhança da equipa de produção do Big Brother que decidia, por detrás dos vidros espelhados, o que e como filmar. Finalmente, reflectindo sobre os efeitos da tecnologia, Pacheco Pereira considerou que «estamos a chegar a uma fase em que as diferenças de literacia se vão manifestar nas nossas escolhas». Os aparelhos estão a colar-se ao nosso corpo, a biologizar-se, a dominar os nossos sentidos, diminuindo a capacidade de mediação. Caminhamos, rematou o conferencista, para um mundo em que o incremento das sociedades mediáticas não leva o logos, o ethos e o pathos; leva antes apenas o pathos, a emoção, manifestamente insuficiente a uma democracia plena. Estas notas de reportagem sobre o debate ontem realizado na Biblioteca Almeida Garrett, no Porto, devem-se a Madalena Oliveira, que é investigadora sobre meta-jornalismo, na Universidade do Minho e a quem agradecemos o trabalho.


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